Soft Cell


Começo dos anos 80 foi marcado pelas duplas de tecnopop. Enquanto os Sparks atormentavam os Estados Unidos no final dos anos 70 com uma visão cômica e freak da modernidade americana, no Reino Unido surgiam os responsáveis pela fusão do tecnopop com outros estilos. Haviam reedições do blues (Yazoo) e referências bregas - a cargo de Associates. Mas a dupla mais espalhafatosa e genial foi o Soft Cell, misturando o kitsch com matizes rosa-choque às inesquecíveis e por vezes dramáticas melodias extraídas dos sintetizadores. O máximo do legado de Marc Almond (vocais) e Dave Ball (sintetizadores, tapes e outras geringonças) foi "Non-Stop Erotic Cabaret", uma viagem ao submundo da pornografia, decadência e solidão. Por conta de suas letras sarcásticas, recheadas de contos eroticamente subversivos, Almond se tornou um herói/vilão da cena clubber da época. Através dos timbres estrategicamente futuristas dos teclados de seu parceiro, o cantor ilustrava suas neuroses, tornando cada faixa de "Non Stop..." um conto inesquecível. Registros como "Bedsitter", a versão imortalizada de "Tainted Love" (originalmente gravada por Gloria Jones), além das sardonicamente ferinas "Sex Dwarf" e "Frustration" - que abre de maneira histérica este clássico dos anos 80 - ostentavam de maneira obsessiva um ponto de vista cínico e ao mesmo tempo romântico dos boêmios e atormentados seres que penavam no anonimato do underground londrino.

Em "Secret Life", Marc, sempre trágico, cantava um infame episódio da vida dupla de um homem casado, imaginando o escarcéu que seria se sua mulher descobrisse sua porção Marilyn. Em "Seedy Films", um de seus personagens participa de um discreto bas-fond numa sessão de filmes eróticos em uma espelunca qualquer - provavelmente nos arredores de Leicester Square. Só que foi na bela "Say Hello, Wave Goodbye" que Almond imprimiu de maneira sublime toda sua teatralidade e sentimentalismo. A música é um dos momentos antológicos da dupla, com os teclados majestosamente orquestrados numa tórrida tentativa de arrancar soluços e lágrimas das almas solitárias.
Dois anos depois a dupla lançou "The Art Of Falling Apart" (em bom português, a arte de se arrasar) e chegou ao fim com o pesado "This Last Night In Sodom". Marc Almond foi exorcizando gradativamente seus demônios com o Marc And The Mambas e discos-tributo a seus ídolos. Dave Ball se afundou na tecnologia de ponta com os seus projetos "English Boy On The Love Ranch" e com o atual "The Grid". No ano passado, Almond conseguiu algum destaque em revistas como Attitude e Gay Times numa retornada do high energy, seguindo os passos de seu coleguinha Jimmy Sommerville.

Luiz A. Pecora


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